Os habitantes de quase duas dezenas de países africanos vão às urnas em 2023 para eleger novos governantes. Os processos eleitorais e os resultados serão um indício para o estado da democratização.
O Ano Novo vai trazer um total de 17 eleições ao continente
africano. Um estudo do instituto de pesquisa britânico Economist Intelligence
Unit (EIU) alerta para a possível volatilidade do período eleitoral em alguns
países da África, onde existe um potencial de protestos políticos,
manifestações de massas e greves.
A primeira questão que se coloca para Fonteh Akum, diretor
executivo do Instituto de Estudos de Segurança (ISS), é se 2023 marcará a
rutura com o fenómeno do crescente número de golpes de Estado registado no ano
corrente., "especialmente à luz da recente tentativa de golpe em São Tomé
e Príncipe". O Governo de São
Tomé afirma que, no dia 25 de novembro, ocorreu uma tentativa falhada de
golpe de Estado no arquipélago.
Para analistas como Alex Vines, chefe do programa África na
Chatham House, com sede em Londres, as eleições no próximo ano serão um fator
chave para a consolidação ou o recuo da democracia no continente.
Consolidação ou recuo da democracia?
"As principais eleições a seguir são as na Nigéria,
África do Sul, República Democrática do Congo e Zimbabué", disse Vines à
DW, salientando haver um potencial de violência em alguns destes países.
Um fator positivo
na democratização da Nigéria o crescente envolvimento cívico e político da
camada jovem da população, diz o analista. Os jovens podem acabar por
mudar o equilíbrio de poder entre os principais partidos políticos.
As eleições da mudança
A tensão é palpável no país com 217 milhões de habitantes, o
mais populoso de África. O atual Presidente Muhammadu Buhari, cumpriu os dois
mandatos previstos pela constituição e não se recandidata. Esta eleições são de
mudança, diz Akum.
O confronto principal é entre o APC (All Progressives
Congress) atualmente no poder e o maior partido da oposição, o PDP (People's
Democratic Party). Segundo o analista Akum, um terceiro candidato poderá,
contudo, ter um impacto significativo na eleição pelo apoio que mobilizou junto
dos jovens na Nigéria: Peter Obi, empresário e candidato do Partido
Trabalhista.
Na África Ocidental cresce a instabilidade propagada pelo aumento do extremismo violento, diz Akum. Esta teve expressão em golpes de Estado militares recentes nos países do Sahel Burkina Faso e Mali, neste último por duas vezes num curto espaço de tempo. Será importante ver como se desenrolará a transição para um governo civil, diz o analista.
Alex Vines está convencido que as crises no continente vão
persistir em 2023, "especialmente no Sahel, particularmente no Mali e no
Burkina Faso, mas também no Níger".
Crises persistentes
Ainda segundo Vines, a situação permanece preocupante também
nos Camarões e na Nigéria, por causa da enorme insegurança nalgumas partes dos
dois países. Outra questão é se o acordo de paz de Outono de 2022 entre o
Governo etíope e a província separatista de Tigray se vai manter. E o norte de Moçambique, onde o terror
jihadista obriga as populações à fuga, continua a ser motivo de alarme.
Acresce a situação no leste do Congo, diz o analista Akum. O
país prepara-se para eleger um novo Presidente e parlamento em 20 de dezembro
de 2023. Acredita-se que o atual Presidente Félix Tshisekedi, que sucedeu a
Joseph Kabila, volte a concorrer. O seu mais provável adversário é o político
da oposição Martin Fayulu.
As atenções vão estar focadas no comportamento de Tshisekedi, frente à violência das milícias no Leste e o impacto que esta poderá ter na condução das eleições.
Segundo Akum, o que importa em todas as eleições é uma
gestão eficaz do processo pelas comissões eleitorais e a sua capacidade de
lidar com desafios.
África do Sul na encruzilhada
Na África do Sul,
o centro económico do continente, o Congresso Nacional Africano (ANC), a antiga
organização de libertação que governa desde o fim do apartheid, voltou a nomear
para a chefia o atual chefe de Estado Cyril Ramaphosa, indicando que será
ele também o candidato às presidenciais de 2024.
Mas Cyril Ramaphosa encontra-se no meio de uma crise
governamental, desde que foi acusado de branqueamento de capitais. A oposição
exige a sua demissão. O partido encontra-se numa encruzilhada. Desta vez,
poderá perder o monopólio do poder que detém desde as primeiras eleições livres
e democráticas em 1994. O que se ficaria a dever à acumulação de anos de má
governação, políticas contraditórias e corrupção em grande escala.
As crises
políticas e humanitárias no continente são exacerbadas por fatores
económicos. "A recuperação económica de África após a crise da
COVID-19 em 2022 foi perturbada por uma série de choques", diz o analista
Alex Vines, que salienta a escassez da abastecimento e o rápido aumento da
inflação, também alimentado pelo impacto global guerra de agressão russa na
Ucrânia.
Como resultado, diz Vines, o pagamento da dívida continua a
ser um problema para muitos países. Ao que se juntam os elevados custos dos
créditos nas piores condições de sempre. "Esta tendência continuará em
2023, embora continue a haver crescimento económico africano", disse.
O que se aplica sobretudo às principais economias africanas,
da Nigéria e da África do Sul. Mas mesmo estas deverão crescer mais lentamente,
de acordo com a Vines. Ainda assim a perspetiva não é só negativa, uma vez que
os preços dos produtos de base, particularmente dos produtos energéticos,
metais e minerais, continuarão a subir.
Ao mesmo tempo, investidores e compradores até agora
relativamente dependentes da Rússia, estão a tentar diversificar as suas cadeias
de abastecimento. Um desenvolvimento que beneficiará muitos países africanos,
entre os quais Angola, Nigéria, República Democrática do Congo, Namíbia,
Tanzânia e Zâmbia.
Sem comentários:
Enviar um comentário